PREFÁCIO

   "Eles se reconhecem entre si por sinais e marcas secretas; eles se apaixonam quase que antes de se conhecerem; em todo lugar introduzem um tipo de lascívia religiosa, uma `irmandade' promíscua." Esta não é uma descrição de uma seita moderna feita por alguma publicação sensacionalista dos nossos dias, mas sim uma descrição - feita no segundo século - dos primeiros cristãos que o sistema romano considerava uma seita de sexo promíscua entregue a orgias em reuniões secretas.

   Os seguidores do "preceito áureo", talvez numa tentativa por parte de alguns justiceiros da fé e reagindo à decadente sociedade romana, adotaram cada vez mais uma postura "moral". No segundo século, doutrinas gnósticas e estranhos livros e histórias apócrifos começaram a circular entre os cristãos.

Estas ficções e imitações das Sagradas Escrituras muitas vezes enfatizavam a "pureza" sexual e a virgindade. Uma dessas histórias fantasiosas foi Os Atos de Paulo e Thecla, que se nada mais, revela que a propaganda anti-seita, fantasias sobre controle mental e tentativas violentas de desprogramação existem já pelo menos desde o segundo século. Thecla, a virtuosa heroína da história, era uma jovem noiva em Icônio, que ao ouvir São Paulo pregar ficou cativada pelos seus ensinamentos sobre a virgindade. Os seus pais, enfurecidos, "sexualizaram" seu comportamento. Paulo é acusado de lançar um feitiço de amor sobre ela e Thecla é acusada de estar controlada por ele, isso pelo fato dela estar "atribulada de um modo tão estranho... como uma aranha na janela presa pelas palavras dele, [ela] está dominada por um novo desejo e uma paixão amedontrante..." Quanto a São Paulo, eles concluem: "Fora com o feiticeiro, porque corrompeu todas as nossas mulheres."
  
Alguns zelosos jovens cristãos estavam tão ansiosos em provar a "pureza" da sua convicção religiosa, que pelo menos um jovem de Alexandria na época de Justino Mártir (100-165 d.C.) pediu ao venerando prefeito que lhe permitisse ser castrado a fim de provar aos pagãos que o sexo indiscriminado com suas "irmãs" não tinha relação nenhuma com o cristianismo. - Contudo deve ter sido difícil erradicar a impressão de seita de sexo, porque em 320 D.C o imperador Licínio promulgou leis que proibiam homens e mulheres cristãos (no império do oriente) de estarem em companhia do sexo oposto nas suas casas de oração.

   No século IV, este perseguido movimento de amor, denominado cristianismo, transformava-se drasticamente. No império de Constantino, o cristianismo foi pela primeira vez tolerado e mais tarde estabelecido como a religião do império romano (Édito de Milão, 313 D.C.). Grandemente influenciados por ensinamentos gnósticos negativos, fracionados em grupos cristãos rivais que se acusavam mutuamente de práticas sexuais esquisitas[7], e cada vez mais desejosos de se distanciarem de qualquer indício de indecência sexual, iniciava-se seriamente no cristianismo o grande cisma da sexualidade e da espiritualidade humana.


   A 1ª Parte de Cristianismo e Sexo explora parte do desenvolvimento histórico - todavia nem sempre com base nas Sagradas Escrituras - dos pontos de vista do cristianismo ortodoxo sobre o sexo. A 2ª Parte mostra as mudanças radicais da atualidade no modo de encarar o sexo, que estão sacudindo o cristianismo.

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